quinta-feira, 5 de novembro de 2009

Sobre a restauração do afeto nos atos de libertação sexual em busca da preservação da libido.


"O sexo é o consolo que a gente tem quando o amor não nos alcança."
(Gabriel Garcia Márquez)


Máscaras. Tão logo chegou a entrada do clube visualizou um painel com inúmeras máscaras à venda. Vestia um sobretudo preto de pêlos sintéticos e a máscara. Agora estava pronta. Antes de entrarem, porém, foi-lhes avisado de que haviam certas normas a serem seguidas (regras num local onde supostamente não deveria havê-las). Primeiro: nada era forçado; segundo: todos deveriam usar preservativos; terceiro: o banheiro feminino era uma área onde nenhuma mulher deveria ser abordada. À parte isso, o casal deveria escolher em que "campo de ação" iria atuar. Opções não faltavam: salas reservadas e menores, com paredes de vidro, cortinas, sofá , cama e uma treliça pequena para os voyeurs; salas abertas com cama gigante para sexo grupal, sala de cinema e o tão famoso e famigerado labirinto: um conjunto de corredores cheio de surpresas que conduzem o casal ao destino final: a saída. Entre as várias surpresas, paredes com "glory holes", buracos por onde mãos espalmadas apalpam carnes suadas do outro lado da parede; onde mastros são içados e manejados por marujos cheios de dentes e de dedos febris, onde chave e fechadura tentam se encaixar para tentar abrir as portas de um prazer cheio de mistérios e que muitas vezes não se combinam.

"Amai-vos uns sobre os outros." (Woody Allen)




Os quatro personagens embriagados em seus desejos de posse carnal, manual, oral, animalesca. Feromônios à mil. Todos no mesmo ambiente sem se cruzarem, pesquisando, observando, tocando, petiscando, sem chegar aos finalmentes. Até que....
O labirinto, o destino final. Jesebel resolve se aventurar em tocar vários membros eretos, estendidos, pedindo um afago. Manipuladora hábil e detalhista que aprendera a ser, no terceiro buraco glorioso, algo se sucedeu: o toque de suas mãos naquele sexo sem roupagem parecia uma "leitura" de cego quando tateia o livro em braille: aquela espessura, aquele tamanho, aquela circunferência não lhe eram estranhos. Mesmo com todas as luzes e falta delas também, mesmo com uma parede se interpondo entre ela e aquele órgão, algo familiar lhe chamou a atenção: o escroto, cheio de veias protuberantes e enviezadas, comprido, com pêlos ralos, pele flácida...só havia uma pessoa assim. Não que ela conhecesse muitos membros, mas ESTE era seu velho companheiro de viagem...ou seria impressão sua? Não, não podia ser. Por um momento se indagou se aquele pensamento e aquela sensação eram imaginação da sua mente preocupada e culpada, receosa de encontrar alguém conhecido naquele ambiente dionísico. Por um instante, sentiu saudade do que nunca teve com seu marido: aquele ardor, aquele fogo desavergonhado que estava tentando descobrir agora. Abocanhou cheia de vontade aquele ser potente e sem nome e começou a fantasiar que Luís Arantes era o nome daquele pênis acariciado por seus lábios quentes.


Apolo e Ágata - Hugo e Jennifer. Ambos ludibriaram seus companheiros, saíram em perseguição da presa certa,e se deparam no mesmo labirinto. Suas sombras se reconhecem. Seus corpos se magnetizam. Almas vagantes e inquietas em busca de repouso para a própria solidão do ser que vende seu corpo, mas não encontra ou dá afeto verdadeiro. Mãos que se encontram, coxas que se tocam, bocas que se beijam. As línguas sedentas de paixão,se atraem e se se enroscam expelindo saliva de mel... Experientes, ávidos e sem escrúpulos, abrem uma porta onde um sofá pequeno e desocupado os aguarda. Exibicionistas, se sentem mais tesudos com os vários pares de olhos que os observam se entregando à luxúria de seus corpos que se encaixam feito o côncavo e o convexo. Algo estranho e inebriante, feito aroma original de café quando se rompe a aurora úmida, atinge suas narinas, e eles percebem que aquele seria apenas o primeiro encontro de uma longa história que estaria por vir.

"O amor é emoção; e o sexo, ação." (Madonna)




Do outro lado do corredor, Arantes muito doido, muito cheio de tesão, esbarrava em corpos suados que se entregavam maliciosos entre carícias eróticas, encostados nas paredes. Entre uma sala e outra, nada o satisfaz e um vazio interno parece corroer suas entranhas. Nada daquilo apetece uma vontade de algo que ele não sabe dizer ao certo o que é. Estava ali, mas aquilo não era exatamente uma novidade para ele. Se sentia frustrado e sozinho. Sua companheira estava vagando nos braços de alguém, nem ele sabia onde, nem
tampouco importava. Resolveu que já que estava ali, deveria se concentrar, e com o membro duro pelo efeito do Viagra, enfiou seu pênis em um buraco cujo destino parecia incerto.
De repente, algo estranho se sucedeu. Uma fina e delicada mão começou a acariciá-lo: girava para a esquerda, para a direita, para cima, para baixo...dedos suaves, com unhas finas e longas fazendo cócegas no seu saco já murcho pelas andanças desta vida. Algo muito familiar naquele toque lhe chamou a atenção. Pensou em Iracy, cujos dedos acariciavam seu peito da mesma forma antes de dormir. Um toque cheio de aconchego e carinho, que ele sentia falta nos toques de Jennifer. Coisa de sua mente carente. Aquilo não era hora para se sentir assim. Até que uma boca quente cobriu a extensão territorial exposta do outro lado da parede, para além dos toques dos dedos e ele reconheceu o aveludado dos lábios que o sugavam feito um sorvete de flocos num dia de verão. O beijo de sua ex-esposa era assim: macio, circular, quente, com dentes curtos e arredondados que jamais machucaram sua língua. Nunca haviam praticado sexo oral, mas ele sabia que se ela o fizesse, este seria o sabor.

Com urgência, ambos pensaram a mesma coisa: quebrar a parede que os separava daquela fome e sede, por um banquete arrebatador de sexo e carinho. Saíram trôpegos, um de cada lado e quando viraram, um para direita, o outro para esquerda, se depararam frente a frente, e sem tempo para surpresas ou questionamentos, sem mais perda de tempo, entraram na primeira sala que encontraram onde um casal também familiar, se comia com sofreguidão.
Uniram-se na mesma cama, nos mesmos gestos, nos mesmos gemidos, nos mesmos olhares de cumplicidade de uma criança que rouba um doce e só pode dividi-lo com um grande amigo, tal é a extensão do segredo que agora têm que guardar.Quer saber mais?


Não tenho autorização da biografada para isso e só eles mesmos para terminarem de narrar o que rolou dali por diante.
Eu sou apenas um voyeur daqueles quatro seres em busca da preservação de si mesmos através do sexo, da libido, da novidade e do amor.
Agora se me dão licença, preciso praticar minha própria preservação. Voilà!

2 comentários:

Eduardo Trindade disse...

Impossível não lembrar do Breve Romance de Sonho, que virou De Olhos Bem Fechados. Gostei da habilidade com que conduzes a ação. Parabéns!

Lohan disse...

Incrível a capacidade que vc tem de descrever tão perfeitamente histórias relativas a sexo, principalmente. E, claro, como vc quebra tabus com tanta naturalidade... Sim, pois, acredite se quiser: apesar das ''modernices'', falar de sexo atualmente ainda é algo totalmente anormal em muitas famílias.
Se vc se propôs a escrever uma história que excitasse o leitor, conseguiu. Me excitou de todas as maneiras! O final era previsível, e mesmo assim, foi demais.
Bjão, até a próxima história caliente! E desculpe interromper sua preservação de si mesma, rs.