quinta-feira, 15 de julho de 2010

Piano


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Buenas, leitores Autorizados!-
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Apresento enfim a terceira tribo que constitui a Nação dos Não-Música, a última que merece algum destaque. A família em questão se divide em duas subcategorias: a dos que não ouvem música, porque não gostam (ou não se importam); e a dos que tem pavor de ouvi-la.-
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Enquadram-se na última os indivíduos que têm medo ou aversão à música, os melofóbicos. Mas a respeito deste subtema, meus leitores merecem uma investigação mais precisa.
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Quanto à primeira subcategoria, minha avó paterna (falecida há alguns anos) foi a única representante que conheci. Impressionava-me aquela criatura de cabelos brancos, curtos e moderadamente cheios, senhora altiva, impassível diante de seu radinho azul e branco, enquanto trabalhando na cozinha fritava algum bolinho, ou batatas-fritas. Aliás, o som crepitante do óleo fervente era o que mais se aproximava de musical para os ouvidos de minha avó Não-Música. No rádio à pilha ela ouvia programas de variedade, desses típicos, com horóscopos, boletins policiais, canções populares, orações... Canções? Mas ela ouvia música? Sim, uma vez que minha avó fazia parte da primeira categoria, ou seja, não sendo melofóbica ela poderia ouvir e não mudar de estação. Porém, jamais a ouvi nem mesmo assobiar qualquer das melodias sintonizadas em AM. Jamais a ouvi comentar sobre seu gosto musical, sobre algum cantor ou alguma canção que tenha marcado sua vida. Em suma, não tenho lembrança alguma de minha avó aos cantos pela casa.
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Caubi Peixoto & meu avô Paulo

Ao contrário de minha avó, meu avô paterno era musical. Antes de se tornar dentista, escreveu novelas para rádio e por lá se encontrava com personalidades como Caubi, entre outros. Pecado não haver nenhum registro, mas eu até (!) já estive no colo de uma das divas da era do rádio (Cachito, eu?) colo que minha mãe conta ter sido da Emilinha Borba (1922 – 2005), esta, que por sua vez fora cliente do meu avô dentista. Bem, isso talvez não tenha muito a ver com as minhas preferências musicais, contudo, meu gosto pela música, assim como por todas as artes, jamais se limitou a um único gênero ou estilo.
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Moonlight Sonata, de Vladimir Kush


Ainda na casa de meus avós, recordo-me do piano encostado num canto da sala. Eu devia ter uns três ou quatro anos, quando pelo menos uma vez por dia a porta de acesso à grande sala da casa dos meus avós era aberta por mim. Escondendo-me por detrás de uma cortina eu contemplava o suave, melodioso, mas também forte instrumento de percussão, sobre cujas teclas desejei me debruçar, correr meus dedos ágeis e sedentos por todas as oitavas, impetuosamente, e todo meu corpo pequenino indo de um lado para o outro. Meu traseiro saltitando na cadeira meio desparafusada poderia me fazer cair, mas então que eu levasse um tombo. Mágoas mais profundas já martelavam os dentes brancos e os pretos do pianoforte, instrumento pronto para todas as emoções. Piano é suave, fraco; forte é... Isso mesmo. E ainda havia os pedais! Não sabia para que serviam, mas pisaria neles também.




Ali, atrás da cortina, era como se eu já soubesse que daquele instrumento precisaria até a morte, pois sobre ele eu lançaria frustrações, toda raiva e incompreensão, alegria, saudades e a única razão pela qual ainda não tenho um sorriso pleno e constante: meus amores que nunca ficam, que no final, mesmo harmonizando-se com minha imensa capacidade de amar, ainda assim me escapam, e rapidamente.
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Voltando a minha infância, embora tenha precisado daquele, não corri em sua direção. Mas como eu queria cruzar a sala de meus avós e violentar aquele corpo musical, socar com meus dedinhos tristes cada tecla, nota, semitom, fazer barulho para que ouvissem a dor que ainda nem havia experimentado. Mas tive medo de levar uma bronca, pelo “violento abuso” (pleonasmo?) Meu avô tinha muito ciúme de suas coisas, mesmo que ele não as usasse. Como eu acreditava nisso, não cruzei a sala, não me sentei ao piano, não destruí mágoas futuras. Cresci como um Beethoven sem ouvido. Sem o gênio. Só com a carranca e os cabelos desgrenhados.
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Ainda tinha três ou quatro anos, quando voltei à cortina para ouvir a música muda que ecoava por todo meu coração. Achei que estivesse cego, pois o piano não estava mais na sala. Puxando a barra do vestido de minha avó, perguntei a ela onde estava a música. Em lugar algum que estivesse ao meu alcance. “Seu avô vendeu o piano.” Foi minha primeira lição de vida. Não deixe o que você tanto deseja ir embora, nunca tenha medo de tentar. Anos depois, na universidade, minha insatisfação maior foi a timidez, um problema que me impediu nos primeiros períodos de tomar iniciativas simples como convidar uma garota para sair. Repetiu-se a história do piano. Ainda não havia aprendido.
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Porém, nos semestres seguintes, minha timidez foi deixando de ser um problema e, consequentemente, passei a abordar as garotas sem qualquer medo de ser rejeitado. Além disso, a vida me deu a chance de um grande reencontro: e a partir dele tive a certeza de que estou aprendendo a viver melhor. Descobri que sou forte. Estou aprendendo a não precisar dos pianos.
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Reencontrei-me com a música.
Hoje tenho uma superbanda:

The Old Times Band--


Dedico esse post aos meus amigos (Autores), Tatiana (superamiga) e vocês que por enquanto só vi por fotos: Andréa, Camila e Lohan.


The piano, de deadly-sinful
(Deviantart)

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□ Stop □
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Grande abraço a todos!
Até a próxima!

E ótima, muito boa, sensacional viagem a todos os Autores S/A que vão pegar a estrada. Pena, pena, pena, sinto tanto não poder estar com vocês...
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Camillo
Landoni
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VIII.

4 comentários:

Camila disse...

Adorei a foto do piano ensanguentado... inspirador...

Unknown disse...

PQP!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!
Esse é mseu melhor post até agora, eva'!!!!!
Estou muito emocionada. De verdade... Posso colocar o link no meu blog?
Pleaseeee...
Lindo e a foto da Old Times está tudo!!!!!! Quero ver vcs ao vivo!!!
Bjocas!

Unknown disse...

A foto do piano é linda!!!! E essa meia de teclas. Eu quero djá!!!!!!

Unknown disse...

Meleca, acabei de ler seu novo post e amei!!!!!
Lindo!