segunda-feira, 26 de março de 2012

"a pro-cura" ou "a cura-pró".





quando perco as forças,

quando me sinto frouxo,

meu inconsciente me toma de assalto,

grito alto,

não sei bem quem sou

ou quem quero ser

 

por vezes sou alguém
que rodeia seu próprio corpo
em torno de um jardim,
imaginário jardim,
que delícia, o Éden,
sou o em.
 

ou sou a delícia

que roçou teu paladar

e escorregou por vias

até arenais e venosas sensações,

sou os sons.

 
sou também a veia
que carrega o néctar
que te manteve
vegetando por entre as flores
daquele jardim,
lembra de mim?

 

sou o vegeto

o dejeto

que caiu por engano

rente ao litoral

onde carneiros pastavam

e crianças brincavam

de se aquecer,

sou o ter

 

sou a lã
o ímã
o domingo de manhã
que você, com sono,
não viu passar
sob sua janela
empoeirada há semanas.
iguanas nas pedras
do box do teu banheiro,
sou o chuveiro.
 

sou o primeiro

o dinheiro

que te comprou

um prato feito

como obra de arte,

sou a parte.

 

sou o inteiro
o posseiro
dos teus dias cansativo.
sou vivo no olho
mas olho o quase nada
de mão parada,
sou a escada.

 

sou a cilada

a estrada

que me levou ao insano

que eu mesmo

não suportei ver.

sou o ser

que colore os caminhos

que levam a pernambuco,

sou o eunuco.

 

sou quase maluco
e te fiz um filho.
sou o trilho
de onde você descarrilou.
sou as ondas de energia
que te jogam
contra a parede,
sou a rede.
 

sou a sede

que molhou teu cabelo ralo.

sou o galo

que não cantou

ontem de noite,

sou a garganta.

 

sou pessoa santa
embora minha imagem
não pertença ao espelho.
sou o velho, o novo e a roda.
me gastei em tentar
descobrir ladeira acima.
sou a rima preciosa
que falhou no teu poema.
sou a algema

que te soltou depois da porta.
sou a morta
que viveu seu sonho lindo
e ainda passa rindo,
sou findo.

 

sou o destino embaralhado

que você guardou

junto com as cartas,

entre o ás de copas

e o valete de espadas,

sou o elmo.

 
sou o oboé
que você soprou
e não tirou som.
sou teu pé com bolhas
exausto de cruzar caminhos
a procura de si mesmo,
sou o esmo.
 

sou minha casa

que me protege da chuva

mas me entrega a mim.

sou meio sem fim,

e desfolho-me lentamente

procurando folhas em branco,

sou o pranto.

 
sou o branco
que cobriu-me
algumas noites
mas deixou-me, um dia, só,
sou o nó.
sou o nós.
 

sou a voz do cantor

que cantou

até virar cigarra.

sou a barra

de quem canta

mas precisa trabalhar,

sou o par.

 
sou o negror
que assola o teu futuro
de algum lado do muro.
sou o escuro
que te espera
na dobra da esquina,
sou aquela menina.

 

sou a sina

de quem pensa que ensina

e não aprende por opção.

sou o pão,

a massa entre teus dedos,,,

as sortes,

os medos.

 
sou o segredo
que me mantém firme
pronto pra negar
o inevitável,
sou inviável,
infalível.
 
sou o combustível

que te trouxe até aqui,

e você nem sabe

porque veio,

eu sou o meio

que uso para estar no meio,

sou o seio.

 
sou o recheio
quando malhas sem parar.
sou o vagar
não parei porque não quis,
sou o feliz.

 

sou atriz,

e acho que você

pode também sê-lo,

basta romper o selo

que te ata ao gelo

que te atormenta o coração,

as vezes, sou a ação...

 

1991

 

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