quinta-feira, 1 de setembro de 2011

A Poesia na Música



Caríssimos leitores S/A, que satisfação estar de volta, retornar com os “posts” sobre o universo musical, após semanas especiais acompanhando o tão bem sucedido concurso de poesia, que germinou, cresceu, completou seu ciclo com força e identidade, mas não se completou o bastante que dele não seja notável ainda uma estimulante fragrância de renovação lírica.

É envolto neste clima positivo de homenagens que saúdo os dois novos Autores S/A, Léon Bloba e O Velho. Sejam muito bem-vindos, e parabéns a ambos por todas as conquistas recentes!


*As letras e os versos dos poemas em destaque não estão na íntegra, são apenas trechos das respectivas obras.




Pegando uma carona com o concurso, vamos aproximar ao máximo, fundir hoje música e poesia. Há muita controvérsia sobre a relação entre estas duas artes cuja matéria-prima é comum, o som (a musicalidade). Porém, quais os limites que garantem a cada uma delas sua autonomia como linguagem artística? Será que devemos pensar em limites rígidos? São duas linguagens diversas, concordemos, e isso nada, nem ninguém pode mudar. Nenhum músico pode descartar o potencial sonoro e rítmico das palavras, assim como nenhum poeta é capaz de negar que versos podem ser musicados com perfeição. Obviamente não é uma relação que sempre dá certo, pois o letrista está constantemente subordinado à dinâmica própria da música, ritmo e harmonia, ou seja, ele deve encaixar com adequação o som e o tempo da enunciação silábica em cada uma das notas e semi-tons das escalas musicais. Contudo, pode  tratar-se somente de singelas adaptações, nada que represente um desacordo sistemático e birrento entre Música e Poesia, só proferido com orgulho por puristas renascentista-aristotélicos sempre fiéis à Deusa Unidade. Tragédia é uma coisa, comédia é outra. Letra é uma coisa, poesia é outra, letrista é uma coisa, poeta é outra. Jamais podem coexistir. Será?  

Mas deixemos estas questões à beira-mar um pouco de lado e mergulhamos logo na praia da música, com sereias poéticas a ornamentar as espumas melodiosas. Para as leitoras, os tritões estão a postos. 




Para início de travessia, voaremos sobre o dorso gótico de um corvo que entrou para a história da poesia repetindo "nunca mais"!, "nunca mais!". O Corvo (The Raven) é uma das obras de Edgar Allan Poe adaptadas por Alan Parsons para o repertório do seu primeiro álbum: Tales of Mystery and Imaginations ­– Edgar Allan Poe, lançado em maio de 1976.    

ALLAN POE POR ALAN PARSONS 


Alan Parsons


Poesia:

“Leave my loneliness unbroken! -- quit the bust above my door!

Take thy beak from out my heart, and take thy form from off my door!"

Quoth the raven, "Nevermore."

(Edgar Allan Poe)



Música:

“And still the raven remains in my room
No matter how much I implore
No words can soothe him
No prayer remove him
And I must hear for evermore
Quoth the raven, nevermore
Thus quoth the raven
Nevermore”

(Alan Parsons, Eric Woolfson)

VINICIUS
VINICIUS


 Se existiu um gênio lírico que não tinha receio de fundir seus versos à música, esse poeta foi Vinícius de Moraes. "Felicidade", de Vinícius e Tom, convenhamos, é só uma das muitas letras do poetinha, cujos versos não deixam de ser poéticos só porque servem à música. Mas antes, no mesmo vídeo, outra preciosidade: "Vai levando", de Chico Buarque, genial compositor que não se diz poeta. Performance de Toquinho e Miúcha "poetisando" numa das performances musicais mais deliciosas. 
         






PABLO NERUDA POR QUILAPAYÚN

Pablo Neruda foi homenageado pelo maravilhoso grupo chileno Quilapayún, formado em 1965. Desde então, os músicos vêm lançando álbuns e material novo com regularidade. Em 1983, exilados na França, compilaram as canções inspiradas nas poesias de Neruda, de 1975 a 1983, no álbum Quilapayún Chante Neruda. Uma destas canções do grupo de Santiago, no Chile, é a belíssima "El árbol de los libres", baseada no Canto 4 do poema "Los Libertadores", lançado no livro de Pablo Neruda, Canto General.  


Poesia:

"Éste es el árbol de los libres.

El árbol tierra, el árbol nube,

el árbol pan, el árbol flecha,

el árbol puño, el árbol fuego.

Lo ahoga el agua tormentosa

de nuestra época nocturna,

pero su mástil balancea

el ruedo de su poderío."

(Pablo Neruda)


Apresentação numa TV francesa, em pleno exílio dos músicos.



A música:


"Este es el árbol de los libres
El árbol tierra, el árbol nube,
El árbol pan, el árbol flecha,
El árbol puño, el árbol fuego,
Lo ahoga el agua tormentosa
De nuestra época nocturna.
Este es el árbol de los libres."
(Pablo Neruda/Rodolfo Parada)   




EUGENIE FIELD POR BUFFY SAINT-MARIE 



O poeta norte-americano Eugenie Field (1850-1895) escreveu a poesia "Wynken, Blynken, and Nod", tão popular nos EUA que em 1938 Walt Disney produziu uma animação de curta-metragem baseada em seus versos. E numa performance emocionante realizada no programa infantil "Sesame Street" (Vila Sésamo), a cantora canadense Buffy Saint-Marie apresenta sua canção do álbum Sweet America (1976), cuja letra é o próprio poema de Eugenie Field, na íntegra.   




Música e Poesia: 
-
(Eugenie Field/Buffy Saint-Marie)

"Wynken and Blynken are two little eyes,
And Nod is a little head,
And the wooden shoe that sailed the skies
Is a wee one's trundle-bed;
So shut your eyes while Mother sings
Of wonderful sights that be,
And you shall see the beautiful things
As you rock on the misty sea
Where the old shoe rocked the fishermen three,--
Wynken,
Blynken,
And Nod."




 DRUMMOND POR PAULO DINIZ



-
"E agora, José"? Quem ainda não ouviu esses versos? 


Drummond, e agora, musicaram teus versos, o poema inteiro, e com que propriedade... Um pernambucano, Paulo Diniz, capítulo grandioso da MPB. Poeta, tu sabes disso, pois foste tu, Carlos, homem das letras, simples e justo, que enviaste uma carta ao próprio compositor, cheio de louros pela qualidade da música. Sabiam que Drummond não conseguiu mais pensar na poesia sem cantar  a música de Paulo Diniz? Taí, outra vez a música se unindo com maestria  a versos antes solteiros. 



E agora, José?
(Paulo Diniz/Carlos Drummond de Andrade)

      


SAMUEL B. YEATS POR LOREENA MCKENNITT



  Stolen Child, poema do célebre poeta irlandês William Butler Yeats, foi brilhantemente musicado por Loreenna Mckennitt, e no vídeo, que é parte do DVD "Nights From the Alhambra", pode se sentir muito do clima desse "show" especialíssimo, regido pela união de uma poesia de primeira grandeza à musicalidade magistral da cantora e multi-instrumentista canadense.  
  


Poema e Música
(Samuel Butler Yeats/Lorenna Mckennit)
"Away with us he's going,
The solemn-eyed -
He'll hear no more the lowing
Of the calves on the warm hillside
Or the kettle on the hob
Sing peace into his breast,
Or see the brown mice bob
Round and round the oatmeal chest
For he comes the human child
To the waters and the wild
With a faery, hand in hand
From a world more full of weeping 
than he can understand" 
---------------------------------------------
-- HOMERO POR SYMPHONY X
-----------------------------------
Gênero épico. Representante,  A Odisséia. A poesia de Homero foi adaptada pela banda Symphony X, no álbum The Odyssey. Aqui, uma pequena amostra dessa adaptação, realizada por um dos mais importantes e musicais representantes do Heavy Metal, para a epopéia grega, daqueles tempos em que ainda estava muito longe de existir a "Literatura."  - ------------------------------------------------------------------------------------------------
-------- - Primeira Parte
-----
    - ------------------------------------------
-
Música:
[Part VII - The Fate of the Suitors / Champion of Ithaca]
----------------------------- Vengeance - it swells within me
As I spy so many who eye my Queen
I'll make them pay for this blasphemy... All will see
Triumphant - Champion of Ithaca
I will right all the wrongs
Let the Gods sing my song
Triumphant - Champion of Ithaca
Let a new life begin
my journey has come to an end -
  -------------------
Segunda Parte 
----------
-- 
- JADE POR JOÃO BOSCO --
- E para encerrar, nada melhor que uma provocação nacional, com especiarias arábicas. João Bosco compôs a canção Jade, cuja letra é ou não poesia, separando-a da música, independente do objetivo para o qual a letra foi escrita?  -
--
------------------------------------------------------------------------------ Música e Poesia: -
-
 Aqui meu irmão ela é coisa rara de ver
E jóia do Xá retina de um mar
De olhar verde já derramante
Abriu-se Sézamo em mim
Ah! meu irmão aqualouca tara que tem ímã
Mergulha no ar me arrasta me atrai
Pro fundo do oceano que dá
Prá lá de babá prá cá de ali
Pedra que lasca seu brilho
E que queima no lábio um quilate de mel
E que deixa na boca melante
Um gosto de língua no céu
Luz talismã misterioso cubanacã
Delícia sensual de maçã
Saborosa manhã
Vou te eleger vou me despejar de prazer
Essa noite o que mais quero é ser
1001 pra você....
Jade...Jade...Jade...
= ---------------------------------------------------------------------

12 comentários:

Thaty Louise Brooks disse...

Já pode gritar?

O que é isso, meu filho? Isso não é post nem aqui nem na China. É a apresentação de uma tese sobre música e poesia, uma dentro da outra, uma respirando a outra.

Sem palavras, que esculacho.

Eu Sou Juliana disse...

Muito singelo e eclético teu post!!
Viva a música, viva a poesia, viva a diversidade artístico-cultural que dá leveza e encanto ao nosso dia a dia!
Vc esculachou (2)!!!!!

Lina Gomes disse...

Nossa, tema muito interessante e bem escrito. Ótimas referências!
Estão de parabéns

Landoni Cartoon disse...

Olá, Thaty, é, e eu digo mais, letra de música pode sim ser poesia e poesia pode sim ser letra de música como demonstrado. Na poesia de Eugenie Fiels ocorreram mínimas alterações, o que não quer dizer que deixou de ser a poesia.

Juliana, viva a diversidade! Não há nenhum estilo de música puro, todos são constituídos por elementos de outros gêneros, por menores que sejam.

Lina, há muito mais referências, pen anão poder colocar todas, mas se pedirem eu poderei fazer no futuro um novo post sobre o tema.

Obrigado a todas vocês, leitoras S/A!!

Anônimo disse...

Perfeito!

Cátia

Ana Beatriz Manier disse...

Camilo, que post bonito! Ótimas referências de intertextualidade.
Beijo, parabéns.

Brooks Thaty disse...

FAço coro com todos os elogios aí de cima! Querdizer que estou descobrindo mais um talento seu, além de desenhar, escreve?

*-*
Beijos, Mandita.

Andréa Amaral disse...

Caraca, sou muito sua fã mesmo!!! Aula de literatura, história da música e com direito a uma ilustração belíssima. TDB!

Débora Lobosco disse...

Muito show, não entendo de literatura, mas deu vontade até de entender!
Muito bem escrito!

Simone Prado Ribeiro disse...

“... música se unindo com maestria a versos antes solteiros.”


Que post mais bacana é esse que vc produziu e nos presenteou, amigo Landoni! Quanto esmero e dedicação impossíveis de serem negados. E como ficou pra lá de interessantes os seus textos tb. Voltou com tudo mesmo, heim?! Que bom! É isso aí!

Ah, claro! Não poderia deixar de elogiar a escolha das imagens tb!

Um Abração!
Si.

Lohan Lage Pignone disse...

Eita, mas voltaram com tudo mesmo, hein?!

Landoni nos presenteou com uma aula sobre o que é poesia, o que é música, e sobre a união de ambas as artes que tanto fascinam.

E ninguém melhor do que você, Landoni, escreveria este texto aqui no Autores. Você é músico e poeta (dos bons), e sabe das coisas.

A última imagem fechou com chave de ouro. Parabéns.

Lohan.

Landoni Cartoon disse...

Recebo com muito orgulho o carinho de todos que deram parte de seu tempo para ler e apreciar o post, que é de vcs e para vcs.
Cátia, Amanda (novas por aqui?), Ana Beatriz, Simone, Andrea, Lohan! Adoro a presença de todos, e Debora Lobosco, que honra também tê-la como leitora! E fala sério, quem cria moda como vc, não precisa entender de literatura, a literatura te entende e atende!

Abs em todos!
Landoni

E não tem post hj pq ainda estou sem computador, peccato! )=