quinta-feira, 16 de setembro de 2010

Tico-Tico no Fubá o mundo todo conhece, já o Abreu...

No próximo domingo, dia 19 de setembro,
o Brasil comemorará 130 anos de nascimento do mestre
-
Zequinha de Abreu.


Espera aí, o Brasil comemorará o quê? Afinal, quantos de nós brasileiros sabemos quem foi e o quanto produziu esse ilustríssimo personagem da nossa história cultural?

Mas nem adianta perder minha serenidade, porque criações tomando o justo lugar de destaque de seus respectivos inventores na pirâmide do sucesso, relegando-os ao subsolo da memória histórica é um fenômeno coletivo que se repete com freqüência. Se procurarmos, encontraremos exemplos na literatura, no cinema, na política, na filosofia, em suma, em todas as áreas do conhecimento.

Na ficção literária temos um bem clássico:

Poucos associam o título do romance “Frankenstein” ao Victor, o criador do monstro; tão poucos que a bizarra criatura parece ter se apoderado do sobrenome germânico. O monstro que na verdade nunca teve um nome, isto é, na história original, tornou-se mais popular que o cientista nascido na Suiça e radicado na Alemanha, Victor Frankenstein. O que dizer então da escritora inglesa Mary Shelley, criadora de toda essa história? Quantos lembram dela?






Zequinha de Abreu não criou o Zonotrichia capensis, vulgo Tico-Tico, mas fez o passarinho trigueiro e sua farinácea alimentação se multiplicarem em forma de música num migrar fantástico para as terras mais longínquas, admirado passarinho que é no meio das mais diferentes culturas do mundo. O compositor brasileiro, nascido em Santa Rita do Passa Quatro (SP), não estudou medicina como queria seu pai, nem fez voto de castidade para ser padre como sonhava sua mãe, em vez disso abraçou a música, talento manifestado desde os seus tenros anos da infância. Desde muito cedo parecia já saber que ia levar a vida na flauta, apesar dos encargos burocráticos de sua vida adulta, soprando música até na requinta, instrumento de sopro menor (e por isso mais agudo) que o clarinete; todos que aos 10 já sabia tocar, e com os quais já esboçava suas primeiras composições. Chegou a estudar num seminário fora de sua cidade natal, mas voltou para Santa Rita e aos 17 anos fundou sua primeira orquestra. José Gomes de Abreu, o Zequinha, viveu intensamente a musicalidade de sua época. Primeiramente tocando ‘nos interiores’ de São Paulo, para os mais diversos públicos e ambientes e para os mais diversos propósitos.


A Valsa (Branca)

www.youtube.com/watch?v=hIXLpER_oHQ (violão)

www.youtube.com/watch?v=mg4jFOuPe5U (piano)

Aos 18 anos casa-se com Durvalina Pires Brasil, de apenas 14, união que lhe deu 8 filhos. Nesta fase, o compositor e instrumentista santa-ritense acumula cargos burocráticos, mas sempre levando adiante sua já admirada e aclamada orquestra. Enquanto se virava para cuidar de sua volumosa família, morre seu pai José Alacrino Ramiro de Abreu. Logo em seguida, em 1920, a família viaja para a capital. Em São Paulo o ritmo de sua música e energia profissional não atravessa, apresentando-se em saraus, casamentos, cinemas (trilha para os filmes mudos), cabarés, festas particulares – vendendo suas partituras para famílias abastadas – em bares, confeitarias, além de ser pianista na extinta Casa Beethoven, especializada em vendas de instrumentos e partituras, onde fazia ouvidos e olhares debruçarem-se sobre sua arte e talento.



Os Pintinhos no Terreiro
www.youtube.com/watch?v=IyD122ZHQ4Y

Aurora
www.youtube.com/watch?v=z1f8qUivldA

Zombando Sempre
www.youtube.com/watch?v=Dc6yxJ-WUa4

Bafo de Onça
www.youtube.com/watch?v=J_thaSTQe_s

Nessa época já havia composto sua música mais conhecida, Tico-Tico no Farelo, sim porque foi com esse título que ele a apresentou num baile em sua cidade natal, no ano de 1917. Porém, o mais inacreditável mesmo é imaginar que Zequinha tenha sido obrigado a mudar o nome do seu Choro mais famoso porque talvez já existisse uma composição batizada Tico-Tico no Farelo, esta composta por Canhoto, o mesmo músico responsável por elevar a reputação do violão no Brasil, antes visto como um instrumento menor, de malandros e marginais. Só em 1931 a música ganhou o título Tico–Tico no Fubá, nome originado de uma frase do próprio compositor, referindo-se à animação dos dançarinos e aos comentários animadíssimos do público empolgado com sua orquestra: “até parece tico-tico no farelo...”

Vicente Vitale:

Músico, estava apenas iniciando seus negócios como editor quando numa ida à Casa Beethoven conheceu Zequinha, encontro que em 1924 resultou na edição da valsa Branca, um retumbante sucesso. Para a editora emergente o sucesso rendeu a Zequinha um contrato de exclusividade, com justa remuneração. Vitale faleceu em 1980, aos 77 anos, justo no centenário do amigo Zequinha, a quem sempre deveu o início muito bem-sucedido da sua carreira de editor.

www.youtube.com/watch?v=CcsSPzr7ays

Alguns logradouros que ganharam o nome do músico:

Rua Zequinha de Abreu, em Maua, SP.

Rua Zequinha de Abreu, Pacaembu, São Paulo, SP.

Praça Zequinha de Abreu, São Bernardo do Campo, SP.

Praça Zequinha de Abreu, Santa Rita do Passa Quatro, SP.

Rua Zequinha de Abreu, Bairro Ideal, Ipatinga, MG.

Bosque Municipal Zequinha de Abreu, Águas de Lindóia.


Sivuca e Hermeto Paschoal
www.youtube.com/watch?v=kfKwiXODlKs

Antes do Choro (ou Chorinho) ser reconhecido como um gênero musical, muita espera se deu até que gênios como Chiquinha Gonzaga, Ernesto Nazareth entre outros fossem aos poucos consolidando o estilo, bem dado (ou dotado de) a improvisações, virtuoso, complexo na execução, riquíssimo em possibilidades harmônicas, modulações, variações e cores, mas (ou por isso mesmo) desabusado, lépido, alegre, ao mesmo tempo emotivo, sentimental. Mas ainda precisava lá no início afastar as execuções da forma de tocar que era considerada mais uma interpretação temperada à brasileira das danças de salão européias do que propriamente um novo estilo e de fato genuinamente nacional. E foi mantendo traços da graciosidade melódica e romântica desvelada dos compassos aristocráticos da valsa e, sobretudo, da polca como os genes europeus da criação, estes unidos aos do maxixe, do lundu, e de todo batuque ‘assanhado’ dos escravos africanos que o Choro foi reconhecido como uma nova expressão musical e tipicamente brasileira.


Vários Ticos-Ticos:





Tico-Tico Kid virtuoso (show!)
www.youtube.com/watch?v=Fkma5rFX3HI

Tico-Tico em ritmo de Salsa



Tico-Tico Quinteto de sax



Tico-tico Mambo!




Tico-Tico banda de Rockers da Indonésia




Tico-Tico Rock N'Roll da Pesada!



Vinte e três anos depois de composta, o sucesso de Tico-Tico no Fubá chega ao ápice. O cinema e principalmente a mais brasileira de todas as portuguesas, Carmen Miranda, dão uma amplitude ainda maior ao que já era retumbante. Filmes em que Tico-Tico no Fubá é incluída: Saludos Amigos, A Filha do Comandante, Escola de Sereias, Kansas City Kitty e Copacabana.


Em 1952 foi lançado pela Vera Cruz o filme Tico-Tico no Fubá, que narra as venturas e desventuras de Zequinha de Abreu, porém de forma romanceada.

Direção: Adolfo Celi

Roteiro: Jacques Maret:

No elenco:
Tônia Carrero como Branca
e Anselmo Duarte como Zequinha de Abreu.

Concorreu ao prêmio no Festival de Cannes.

(Tatiana, uma sugestão,
porque vc não faz uma menção desse filme no seu blog? Hein, que tal?)



Tanto fora quanto na internet há poucas manifestações de homenagem à Zequinha de Abreu; enfim, que as novas e também as antigas gerações conheçam logo e se deslumbrem com a obra desse que é um dos maiores compositores de nossa música.







XVII.

7 comentários:

Ana Beatriz Manier disse...

Landoni é cultura!
Que objetividade e fluência gostosa tem o seu texto! Já havia ouvido falar de Zequinha de Abreu, mas daí ligar seu nome às suas obras...
Bem, zero na prova eu também não tiraria, pois, pelo menos, já li sobre Mary Shelley e sempre me senti orgulhosa por Frankstein ter saído de uma mente feminina.
Congrats!

Unknown disse...

Concordo com a Bia!!!
Adorei o texto!!! Adorei as imagens também!!!Meodeos, como a Tônia Carrero é linda!!! Quero ver o filme sim, e quero o poster now, que é uma gracinha!!!

Lindo post, obrigada por me apresentar à Valsa Branca, que canção mais PERFEITA!!!!
Bjocas, bjocas!

Unknown disse...
Este comentário foi removido pelo autor.
Anônimo disse...

porra, mó aula de música brasileira.
Valeu a homenaegem linda!

Gléris disse...

Show!!
Dificil ver na mídia alguma coisa sobre Zequinha Abreu.
Obrigada pela homenagem ao grande músico.

Lohan Lage Pignone disse...

Aula de música brasileira, nota dez com louvor, professor!

Encantado com a sua destreza em tratar dessa arte tão magnífica, que é a música. É mais que uma arte, na verdade...

Não conhecia o Abreu, portanto, quando vierem de gracinha agora, "Você conhece o Abreu?", eu responderei "O Zequinha? Claro! Aprendi com o Landoni. E esse, você conhece?"

Abraços, e parabéns.

Andréa Amaral disse...

Você deveria ter seus textos incluídos na bibliografia de livros de Ensino de todo o Brasil.
Só pode levar dez?