Já não era a primeira nem a segunda vez que Paulo chegava em casa naquele estado, completamente bêbado, no meio da madrugada fazendo barulho e incomodando os vizinhos. Sua mulher já não agüentava mais aquele tormento, seu marido não se parecia em nada com aquele homem com quem ela casou havia mais de dez anos. Aquele homem jovem sonhador que queria logo ter filhos e mudar pra uma cidade do interior, construir um chalezinho com lareira e jardim de inverno.
A cada noite que Paulo chegava em casa naquela situação ela via seus sonhos de ser feliz se distanciando cada vez mais, já não encontrava mais desculpas para dar aos filhos que perguntavam toda noite pelo pai. "Por que que ele não ficava mais com eles? Porque não viam mais filmes juntos? Porque o papai não fazia mais pipoca com pedacinhos de bacon que eles tanto gostavam?", "O que houve com o papai?" Eram muitas perguntas e poucas respostas.
Paulo, no dia seguinte sempre acordava passando mal, seu estômago doía. Ele sempre foi fraco com bebidas e procurava se fazer de forte, não podia demonstrar que aquilo vinha lhe fazendo mal, mas ficava com vergonha e ia trabalhar antes que os filhos acordassem. Às vezes ficava dias neste ciclo, chegando tarde, saindo cedo, bebendo, se alimentando mal, sua aparência era de um homem de uns 45 anos, embora ainda tivesse com 35 anos.
Passava mais tempo com os “amigos” do que com sua família. Até que um dia o improvável aconteceu: Paulo foi demitido. Suas vendas estavam cada vez mais baixas e a empresa, também sofrendo com a crise, resolveu cortar custos diminuindo a equipe e como sempre o critério foi o desempenho. A notícia foi como um soco na boca do estômago. Paulo lembrou das dívidas que tinha, do cheque especial estourado, do carnê do carro, das compras do mês, do colégio das crianças e até da conta do bar. Sua vontade era sumir, correr para um lugar mais distante possível daquela vida que ele mesmo construiu para si. Mas, para onde correr?Quanto mais ele pensava em correr de si mesmo, mais sua consciência o perseguia, mais ele via o tempo perdido em bares, mais ele se via trabalhando desanimado no dia seguinte, mais ele reconhecia o quanto ele vinha trabalhando mal, achando que nunca iria ser mandado embora.
Mas chegou o dia de colher o que ele já vinha plantando há tempos, sua vida vinha em sua cabeça em flashes, como um filme. Seus filhos cada vez mais distantes, cada vez ele participava menos do crescimento e da vida daquelas crianças tão planejadas. Lembrou também de sua esposa, sempre fiel; muitas vezes ela a fez sofrer, chorar por tamanha inconseqüência. alegava que havia casado cedo demais e tinha de curtir um pouco a vida, mas agora via que estava perdendo tempo, que podia curtir a vida sim, mas de uma maneira mais saudável, mais feliz até. Neste momento Paulo chorou, chorou de doer a barriga. Sentou-se num meio fio e se sentiu totalmente sozinho naquela situação de tanto sofrimento. Não viu o tempo passar, já era noite e ele se sentiu sozinho. Os amigos do bar não vieram encontrá-lo quando souberam que ele tinha perdido o emprego. "Será que eram mesmo amigos dele ou do álcool?" Paulo pensava, pois se lembrava das noites de farra, de gastança e ao mesmo tempo se lembrava de seus filhos e sentiu vontade de ir pra casa, mas tinha vergonha, não sabia como dizer a sua companheira que fora demitido, que iam passar ainda mais sufoco para pagar as contas que já não andavam em dia. Tudo isso se passava naquela cabeça, quando ele já perto de casa e sem coragem de entrar escuta alguém lhe chamar:
-Paulo!
Ele olha para trás e reconhece Arthur, um colega de seu trabalho que não participava daquelas festinhas de happy hour, era também uma pessoa que tinha mulher e filhos e os preservava. Arthur sempre lhe aconselhava a não gastar tanto, a ir pra casa depois do trabalho, a voltar a estudar, pois Paulo trancara a faculdade alegando que tinha de pagar o colégio dos filhos, mas gastava mais nos bares e nas farras do que com o colégio. Paulo via naquele homem um bom exemplo de pai de família, de homem cumpridor dos seus deveres e naquele momento se alegrou de ver aquele amigo, pois precisava de alguém para desabafar, chorar. Seu amigo, ao saber de sua demissão, foi procurá-lo, pois sentia que Paulo em sua essência tinha um bom coração, só precisava abrir os olhos para sua realidade, precisava de alguém que lhe estendesse a mão. Arthur logo que viu Paulo entendeu que a “ficha” havia caído. Com aquele baque, Paulo sentiu o peso da responsabilidade de ser um pai, um chefe de família, perante a sociedade, perante a si mesmo e perante a Deus. Começou a conversar com Arthur, que o aconselhava, orientava o amigo, mostrando um caminho melhor a seguir.
Paulo viu naquele homem uma manifestação de um poder superior em sua vida, sentia que chegara ao fundo poço com a perda do emprego, mas também sentia que era o momento de se reerguer, reconquistar sua família, sua moral, dar valor a realmente quem tem valor e assim o fez. Foi para casa, conversou com sua esposa, viu filmes e brincou com seus filhos, como fazia em outros tempos. Se comprometeu que a partir daquele momento não beberia mais, se transformaria num novo homem, num melhor pai e melhor marido. No dia seguinte, Paulo saiu para procurar trabalho, mas já com uma indicação dada por seu amigo na noite anterior, foi para a entrevista pensando nas palavras de orientação e pensando que poderia sim colocá-las em prática. Muitas vezes é preciso sofrer para reconhecer que vida que estava levando não estava boa nem para ele, nem para sua família, tão querida e que nem nos momentos mais difíceis o abandonou.
Esta pequena história nos mostra que sempre é tempo de recomeçar, a cada nascer do Sol de um novo dia temos a oportunidade de renascermos para nossa própria vida, é preciso que estejamos “ligados”nas oportunidades que vêm, para que a gente possa ser mais feliz e ter uma vida mais tranqüila.
6 comentários:
Você como sempre, enche nossos corações de esperança e tem sempre a palavra certa, amiga e incentivadora para servir de exemplo e porta da esperança para alguém que possa estar atravessando os problemas que você aborda tão bem, seja com textos mais didáticos ou fictícios.Parabéns duas vezes, por sua criatividade e por seu ombro amigo.
Sua história me fez lembrar um tio que tenho... Um cara de extremo talento como marceneiro, que já teve esposa e tem duas lindas filhas. Mais jovem do que a idade que a aparência acusa e que perdeu tudo por causa da bebida. Hoje, quando o encontro, não reconheço nele o tio que me ensinou a nadar e que me carregava nas costas para subir em árvores, brincava de me pendurar de ponta a cabeça e me chamava (e ainda chama) de Camiloca. Hoje não consigo mais fixar meu olhar nele, porque seu referencial de alegria simplesmente se foi... E isso me dói. Queria ser capaz de escrever um final feliz digno para ele, mas não posso.
Lindo! Seu texto, a sensibilidade, tudo. Bjo.
João, João, bem diz minha sábia mãe, a gente colhe, o que nós plantamos. A vida cobra da gente, exige de nós, por isso temos que estar sempre atentos as escolhas de nossas vidas, se a gente escolhe o caminho errado, estamos fazendo de nós pessoas erradas, mas se nós escolhemos o caminho certo, reto, estaremos fazendo o bem, e consequentemente teremos coisas boas para colher. Então façamos de nossa vida, uma vida produtiva, com a colheita do bem!!!
Estou adorando seus textos! Parabens, Que Deus continue sempre a te abençoar!
Grande John, rs. Legal o seu texto, cheguei a me lembrar de alguns testemunhos daquele programa, ''Fala que eu te escuto'', no qual muitos passam por isso, encontrando a salvação no reino de Deus. Na minha opinião muitos que ali são divulgados, são sensacionalistas. Mas servem, ao menos, para abrir os olhos para a realidade, para o sofrimento, e para a misericórdia de Deus. Obrigado João, vc é um homem abençoado.
Vocês como sempre são tão gentis comigo,escrevi este texto correndo,levei meu "lap top" comigo enquanto ia trabalhando e depois que postei que vi que comi letras,e outros erros,mas como sempre vocês me alegram com suas palavras de força e compreensão e me incentivam a continuar escrevendo,me desenvolvendo,sou grato de coração pela oportunidade que estou tendo.
Felicidades para todos!!!
João,
Parabéns!Você consegue passar uma lição de vida ,contando uma história...
vc vai longe!!!
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