quarta-feira, 15 de julho de 2009

Uma nova mensagem



"Preciso muito falar com você. Vou te ligar às 18h, atenda por favor."


Ficou meio cismado com a urgência da mensagem. Passou os dedos pelas teclas do telefone, mas achou melhor não ligar, ela avisou que ligaria mais tarde. Fazia um tempo que não se falavam, uns três meses ou mais.

Durante todo o dia aquela frase não saiu da sua cabeça: "Preciso muito falar..." Nunca foram muito de conversar, desde a primeira vez que se viram, a atração era tão grande que as palavras eram completamente dispensáveis. Passavam a maior parte do tempo entre lençóis e não sobrava muito tempo para as conversas.

O que poderia ser assim, tão importante? Seus encontros sempre foram casuais, sem cobranças, sem muito planejamento, bastava um dos dois ligar e dizer que estava afim e pronto, lá estavam os dois juntos e, depois cada um seguia para sua casa. Era normal ficarem dias, semanas e até meses sem se ver. Ele sabia que ela era casada e que nunca iria largar o marido. Isso jamais o incomodou, afinal, ele também não abriria mão de sua vida de solteiro por nada nesse mundo. Não gostava muito de pensar na lógica que havia naquela relação. O importante era que os dois estavam satisfeitos daquele modo. Ela sabia que ele estava ali, disponível e ele sabia que poderia vê-la sem ter que abrir mão de todas as outras. Não sabia se a amava, nunca havia amado ninguém.

A partir de 17:45 ficou com o telefone em mãos, tomado por uma estranha ansiedade, aquelas mãos, que agora suavam. Constantemente ele olhava o visor do aparelho para conferir se havia sinal ou bateria suficientes. Não queria perder aquela ligação. Às 18:03, finalmente o telefone tocou:

- Oi, tudo bem? Recebeu minha mensagem?
- Recebi. Comigo tá tudo bem e com você? Algum problema ou era só saudade mesmo?
Ela riu e respondeu:
- Éhh... Preciso muito te ver, falar com você pessoalmente.
- Bem... eu tava saindo pra jantar, pode ser agora? Quer que eu te pegue perto da sua casa?
- Agora? Tá bem, mas não precisa me buscar. Vamos marcar naquele restaurante onde nos encontramos da primeira vez, pode ser?

Depois que desligou o telefone ele ficou lembrando daquela noite, daquele restaurante, da primeira vez... Lembrou de como ela estava vestida, tão elegantemente que ele jamais entendeu o que ela viu de interessante nele. Lembrou do olhar dela. Aquele olhar despertava nele um instinto voraz, animal, algo que ele não sabia controlar.

Ele foi o primeiro a chegar. O restaurante estava vazio. Ótimo, pensou, assim poderiam conversar sem pressa e sem atropelos. Vinte minutos depois ela adentrou o salão do restaurante. Estava ainda mais bonita, levemente bronzeada, trajando um vestido mais curto que o usual. Equilibrava-se muito bem no salto alto, seus cabelos e seus quadris balançavam num compasso divinal. Levantou-se meio atrapalhado da cadeira, Tocou suavemente a mão no braço dela, inclinou-se e beijou-lhe o rosto. Ela sorriu.

O garçom trouxe o cardápio e sem nem mesmo folheá-lo, ela fez seu pedido:
- O que for mais rápido, sei lá, uma pizza de mussarela, estou ansiosa.
Ele gaguejou:
- Pra pra mim também, pode ser o mesmo.
Antes que o garçom terminasse de anotar os pedidos, ela disse:


- Tô numa situação... Preciso da sua opinião... Me ajuda!
- Claro. O que eu puder fazer pra te ajudar... Conte comigo.
- Eu me separei do meu marido.
- Caramba... Sério?
- É. Eu tô completamente apaixonada por um cara. Ele me chamou pra morar com ele na Inglaterra.

Ele ficou calado. Sentiu como se o sangue tivesse parado de circular pelo seu corpo, começou a sentir frio, suas pálpebras fecharam por dois segundos, respirou fundo, a boca secou. Não conseguia dizer uma palavra sequer. Aquilo tinha sido como um disparo, direto no seu peito.

Ela esperava uma reação dele.

- Não sei o que te dizer. Sinceramente não sei.
- Como não sabe o que me dizer?
- Não sei, ué, não sabendo. O que você queria que eu dissesse?
- Qualquer coisa. Você é meu amigo! Tem que me dar conselhos.

Ele riu ironicamente, enquanto balançava a cabeça negativamente. A pizza chegou depressa, ele olhava para o prato e nem lembrava mais o que havia pedido. De repente não conseguia pensar em mais nada. Não sabia mais nada. Outra vez respirou profundamente. Calmamente cortou a pizza em pedaços, deu uma garfada no prato e tentou pensar em algum conselho que expressasse o que estava sentindo.

Enquanto ela comia, o observava atentamente, à espera de alguma palavra. Ele deu a segunda garfada no prato, ficou de pé, engoliu a comida, limpou a boca, jogou o guardanapo na mesa e disse:

- Quer saber? Eu acho que você não deve ir pra Inglaterra, não. Eu acho que você deve ir pra puta que pariu! Você, seu marido e seu namorado!

Tirou do bolso umas notas de dinheiro emboladas e jogou sobre a mesa. Saiu pisando duro. Ao cruzar a porta de saída o garçom lhe disse:

- Boa noite, senhor!
- Só se for pra você.

Entrou no carro, bateu violentamente a porta. Ligou o som, ajeitou o retrovisor, engatou a ré. Logo tirou o carro da vaga e acelerou o mais que pode, enquanto Roberto Carlos cantava no rádio:

"Não preciso nem dizer
tudo isso que eu lhe digo,
mas é muito bom saber
que você é meu amigo...
"

Desligou rapidamente a música.

- Amigo é o caralho!

18 comentários:

Andréa Amaral disse...

KKKKKKKKK.Amei Camila.Esse foi o maior desbunde que ele poderia levar.O tom certo, detalhe por detalhe....até atingir o clímax inesperado e terminar magistralmente de maneira hilariante.Um sarro total!Você é fabulosa com descrições.Consegui visualizar cada cena como numa novela.Nota 10!

Lohan disse...

Como vc descreve bem, Camila! Cronista nata, e visivelmente, inspiradíssima no ''Fonsecão'' rs. Ouvindo essa música no final, eu fiquei rindo, lembrando do cara...rs Palmas pra Camila! (Aguardando ansioso a próxima quarta-feira, rs). Mas, como diz a música do Rei, ''não preciso nem dzer tudo isso que eu lhe digo''... Bjs!

Sim! Podemos pensar! disse...

Fantástico!!!
Muito bom!!!
Gostei muito,me identifiquei,mané amigo...rsrsrsr
Manda muito bem!!!

Sidarta disse...

Rsrsrs
Assino embaixo o que a Andréa disse.
Eu também fiquei imaginando a cena, tamanha a riqueza de suas palavras.

Olha, estou pensando em escrever meu primeiro livro.

Acho que você devia fazer o mesmo.

Beijos!

k@ disse...

caracas! Amei!

Camilíssima Furtado disse...

Muito obrigada aos meus colegas do blog pelas gentis palavras, vocês são demais! Sidarta, sua visita ao Autores S/A me deixou imensamente feliz!!! Obrigada pelo carinho constante na Caixa de Pandora e agora, aqui. Adorei a ideia do livro!!! Beijos a todos.

Marcio Mascarenhas disse...

colega é o caralho...kkkkkkkkk muito bom o texto e principalmente a reação inesperada do personagem, parabéns Milla bjão

Unknown disse...

P.E.R.F.E.I.T.O.

Um desbunde em alto estilo..rsrsrss
Me senti dentro da história, os detalhes, maravilhoso texto...
Parabéns....Bjim

"Amigo é o caralho!"

KKKKKKKKKKK

E a música....rsrsrsrs

Thais disse...

Camila, parabéns pelo talento e iniciativa. Muito sucesso para você!! Beijos da sua prima ''emprestada''

Thais

Matheus Silveira disse...

Hauhauahaua "Amigo é o caralho!" Putz, essa frase no final ficou perfeita, não dá pra ler e não comentar. Parecia que até o Roberto Carlos tava zoando o cara! Demais, viajei na cena toda. Vc escreve fácil, quando crescer quero ser assim!
Beijão, menina sumida.

Claudinha disse...

Nossa, tá demais! você escreve super bem contos. Eu que estou acostumada com suas poesias, confesso que me assustei um pouquinho com esses palavrões rsrs... Mas claro, teve tudo haver com o conto (conto ou crônica? não sei direito a diferença)Mandou muito bem, como sempre. Continuo sua fã. E a Caixa, como fica?
Beijos.

Camilíssima Furtado disse...

Marcinho, Gê, Thaís, Vinny (poético como sempre), Matheus, obrigada pelo carinho.
Clau, palavrões? onde? Não fui eu, foi meu eu lírico e desbocado. Não é conto, nem crônica, é um emaranhado de baboseiras que eu amo escrever. Don't worry, a Caixa permanece sob os cuidados de Pandora. Bjs a todos!

sabrina menedotti disse...

o post ficou otemo querida!
360°

=*

Unknown disse...

Camila, simplesmente...
Nota 10!!!
Adorei a trama, os detalhes e principalmente o "desfecho" rsrsrs
Parabéns, vc escreve muito bem!
Bjs cor-de-rosa e saudades!
Dani

Camilíssima Furtado disse...

Sabrina, obrigada pela visita vinda da blogsfera! Seja bem vinda! Dani, obrigada pelo carinho e por ter vindo até aqui prestigiar o blog. Saudades também, Barbie! Bjs.

Gilberto Farias disse...

Moça-Pandora dos infinitos enigmas,

Na ponta da língua do poema
há saberes e sabores:
Sabores de poemas degustados
e saberes de linguagens
a serem aprendidas.

Adorei a sensibilidade que te aflora.

Beijo envolto em rimas.
Gil

Camila disse...

Gil, meu querido amigo!!! Obrigada pela visita e pelas gentis palavras!!! O poeta caminhante lunar...

Unknown disse...

parabens , quero conhecer essa autora. maravilhoso, adoreiiiiiiiii tudo de bom